Em um cerco à exploração ilegal do ouro no país, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal investigam um empresário de Goiânia acusado de liderar um esquema responsável por enviar minério extraído da Amazônia para os Estados Unidos, Itália, Emirados Árabes e Egito. Ao todo, segundo as apurações, Harley Franco Sandoval e o grupo do qual ele faz parte exportaram R$ 89,5 milhões nos últimos dois anos, o equivalente a pelo menos 294 quilos do metal precioso.
Em um cerco à exploração ilegal do ouro no país, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal investigam um empresário de Goiânia acusado de liderar um esquema responsável por enviar minério extraído da Amazônia para os Estados Unidos, Itália, Emirados Árabes e Egito. Ao todo, segundo as apurações, Harley Franco Sandoval e o grupo do qual ele faz parte exportaram R$ 89,5 milhões nos últimos dois anos, o equivalente a pelo menos 294 quilos do metal precioso.
Na ação, o empresário responde pelos crimes de falsidade ideológica, receptação, lavagem de dinheiro, organização criminosa, posse irregular de arma de fogo, contrabando e executar pesquisa ou extração sem autorização, além de crimes contra a ordem econômica. As penas somadas podem chegar a 29 anos de reclusão.Procurado, o advogado do empresário, Paulo Emilio Catta Preta, afirmou ter assumido o caso recentemente e só se pronunciará após se inteirar do inquérito policial. O defensor anterior, Eduardo Oliveira, não quis se manifestar.
Movimentação ‘atípica’
Sandoval se apresenta nas redes sociais como “pastor” e “administrador de empresas”. Além da atividade religiosa — ele pertence à igreja Sara Nossa Terra de Goiânia —, o empresário e seus familiares abriram companhias de mineração e joalherias. A principal delas era a Mineração Serra Pelada, que movimentou R$ 1,47 bilhão entre 2020 e 2022, segundo levantamento da PF. A entrada e saída de dinheiro foi considerada “atípica” e “incompatível” pelos investigadores.
Depoimentos colhidos pela PF indicaram que a atividade irregular de mineração ocorria em áreas nas cidades de Itaituba, Cumaru do Norte e Ourilândia do Norte, no interior do Pará. Uma das evidências da exploração ilegal do minério é a empresa ter adquirido mais de R$ 7 milhões em óleo diesel nesses municípios. Segundo relatório da investigação, esse grande volume de combustível era usado para abastecer as máquinas pesadas que revolviam o solo atrás do ouro.
Sandoval é acusado de utilizar uma Permissão de Lavra Garimpeira (PLG) da cidade de Natividade, no Tocantins, localizada a mais de 800 quilômetros de distância das áreas onde a exploração de fato ocorria, numa estratégia para tentar legalizar o produto extraído irregularmente do Pará. Como tudo que há embaixo da terra é propriedade da União, as PLGs funcionam como uma espécie de concessão dada pelo governo federal para garimpeiros artesanais — o que não é o caso do empresário.A permissão de Natividade se refere a um terreno de garimpo inativado desde a época colonial. Um dos sócios de Sandoval, que também detém a autorização, declarou às autoridades nunca ter encontrado uma grama de ouro ali.
Mesmo assim, a permissão na cidade tocantinense foi utilizada para justificar a extração de 310 quilos de ouro registrados pelo grupo denunciado no sistema da Agência Nacional de Mineração — o órgão que fiscaliza a atividade mineral no Brasil. Segundo o MPF, Sandoval registrou por pelo menos 87 vezes “informações falsas” no sistema da autarquia.Com os registros em mãos, o grupo conseguia inserir o ouro ilegal na cadeia econômica do metal por meio de uma DTVM (Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários), que são instituições autorizadas pelo Banco Central para comprar esse tipo de material.
As DTVMs abrem o caminho para que o minério entre no sistema financeiro e no mercado internacional com aparência de legalidade.Pela legislação atual, o garimpeiro faz uma autodeclaração de onde ele retirou o metal, mas a DTVM não confere a informação. O governo federal propôs um projeto em julho deste ano para aumentar a fiscalização sobre as DTVMs e acabar com a chamada “presunção de boa-fé” dessas declarações. A proposta ainda está parada no Congresso Nacional.
Presença de mercúrio
Para as vendas internacionais, o empresário recorria a outra empresa em nome de uma parente dele. Segundo a PF, essa companhia fez pelo menos 20 remessas de ouro entre dezembro de 2022 e maio de 2023 aos Estados Unidos, Itália e Egito por meio do Aeroporto de Guarulhos.
Outra parte da carga teria sido enviada pelo empresário Brubeyk Nascimento, que é considerado pela PF como um dos maiores contrabandistas de ouro do Brasil. Ele foi preso na semana passado após autorização da Justiça do Tocantins, do Amazonas e de Roraima.Conforme os investigadores, ele seria “sócio” do pastor de Goiânia e responsável pela comercialização do ouro extraído na Terra Indígena Yanomami.
A defesa de Nascimento disse que não iria se pronunciar sobre as acusações.Além das mineradoras, a PF descobriu que Sandoval adquiriu em 2022 uma fazenda chamada “Nova Esperança”, em Bannach, no interior do Pará. Chamou a atenção dos investigadores que a propriedade é vizinha à Terra Indígena Kayapó, que enfrenta problemas com a invasão de garimpeiros ilegais. Imagens de satélite mostraram que havia áreas de extração na propriedade, que não possui autorização para isso.Em uma das operações da PF, os agentes encontraram mercúrio no local. O metal tóxico é usado para separar o ouro da terra.
A Justiça Federal determinou busca e apreensão na fazenda, além de mandar suspender os CNPJs de Sandoval, de seus familiares e de Nascimento.Antes de entrar no ramo da mineração, o empresário foi assessor da Secretaria Municipal de Obras da prefeitura de Goiânia e candidato a vereador em 2012 pelo Partido Verde — uma sigla que se identifica pelas causas ambientais. Ele não se elegeu ao cargo.