A professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Maria Amélia Enriquez, especialista em assuntos relacionados a minérios no Brasil, revela uma informação inusitada sobre o uso que as prefeituras fazem do dinheiro que recebem através da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM): apenas 38% dos 30 municípios que mais produzem minério no país informam de maneira clara os setores onde aplicam os recursos dos royalties da mineração, repassados pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Ou seja: 62% dos municípios não estariam sendo transparentes sobre a destinação do dinheiro. A informação consta em um estudo divulgado recentemente pelo Centro de Tecnologia Mineral (CTEM), do Ministério da Ciência e Tecnologia, e está disponível ao público numa página da revista internacional “Science Direct”, direcionada ao assunto.
A especialista defende que os municípios sejam mais transparentes sobre o que fazem com a compensação financeira que recebem. “É importante esse trabalho recente que o CTEM [Centro de Tecnologia Mineral] publicou, em uma revista internacional, numa amostragem dos 30 maiores municípios para ver o grau de transparência; como é que esses municípios estão utilizando — e apenas em 38% deles foi possível verificar com que a CFEM estava sendo gasta. Ou seja, para 62% não tem informação nenhuma sobre o uso dessa compensação financeira”, aponta a especialista.Autora do livro “Mineração: maldição ou Dádiva?” e de diversos artigos sobre o tema, Enriquez auxilia vários estados a elaborar planos estaduais de mineração. Ela lembra que a mineração é um recurso totalmente finito: “Um dia esse recurso exaurível vai terminar, então [a CFEM] é uma forma de o município produtor ter uma garantia para se preparar para uma vida futura sem mineração”. O Centro de Tecnologia Mineral (CETEM), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), é um órgão que atua no desenvolvimento de tecnologia para o uso sustentável dos recursos minerais brasileiros.
No âmbito do governo federal, o CETEM é o único instituto de pesquisa dedicada à tecnologia mineral e ao meio ambiente (acesse o link para o estudo citado pela professora ao longo desta matéria).Maria Amélia Enriquez alerta que os recursos da CFEM devem ter destinação, conforme prevê a Constituição, para que o município que produz tenha no futuro uma maneira de viver economicamente de outras áreas. “Tenho acompanhado mais de perto aqui os municípios do Pará. E o que a gente observa é uma preferência por gastos em infraestrutura de transporte, ou gastos administrativos — muito mais do que uma promoção de atividades econômicas”.
De acordo com a especialista, ainda falta muita transparência no setor. “Me surpreende também saber que, com toda essa evolução da mineração, nós [só] temos 2.100 municípios mineradores Quando trabalhei a minha tese, no começo dos anos 2.000, tínhamos 2.300 municípios mineradores. Então teve uma regressão quando a gente vê que teve, na verdade, um aumento na produção”.
A professora destaca que o uso dos recursos da CFEM pelas prefeituras e estados mineradores precisa ser feito com critério. “De fato, a CFEM não tem uma vinculação, mas a legislação deixa claro o não-pagamento de dívida de pessoal permanente — e, no parágrafo 13º artigo da nova lei, da lei 13.540, ele coloca a necessidade de ter uma absoluta transparência no uso dessa compensação financeira.
No parágrafo 6º, orienta sobre a possibilidade de usar uma parte dessa compensação financeira para mineração sustentável, em ciência, tecnologia e inovação, justamente prevendo essa necessidade de promover uma diversificação econômica para fazer a diferença na vida da comunidade local no futuro”, explica. Depois de Minas e Pará, estados de Goiás, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo são os maiores beneficiários dos repasses da CFEM.