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O Amapá. O Fundo de Pensão. O Banco de Brasília. Os R$ 100 Milhões em Títulos. A Carteira de Investimentos e a Operação Arriscada

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O fundo de pensão do Estado do Amapá (Amprev) decidiu aplicar ao menos R$ 100 milhões em títulos do Banco de Brasília (BRB) em fevereiro deste ano. A operação está em desacordo com resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) e tem potencial de aumentar o risco da carteira de investimentos. O fundo é formado a partir de recursos públicos e voltada para o pagamento de aposentadorias e pensões de um universo de cerca de 30 mil servidores estaduais. Procurados, o BRB não comentou, e o Amprev não respondeu até a publicação desta reportagem.

A transação se deu cerca de um mês e meio antes de o BRB anunciar a compra de uma fatia de 58% do Banco Master — ainda dependente da aprovação do Banco Central (BC) —, no final de março. O fundo do Amapá soma R$ 1,56 bilhão em letras financeiras em seu balanço, ou 18,45% do patrimônio total. O fundo é também o segundo maior detentor de letras   Banco Master entre entes de previdência de Estados e municípios, com aplicações que somam R$ 400 milhões, o equivalente a 4,95% da carteira total

Os investimentos foram feitos sob a gestão de Jocildo Silva Lemos, presidente da instituição do Amapá desde 2023 e membro do diretório local do partido União Brasil. No Conselho Estadual de Previdência (CEP), órgão deliberativo que orienta as operações do Amprev, está também o advogado Alberto Samuel Alcolumbre Tobelem, irmão do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que também comanda o diretório regional do União Brasil.

Um artigo da resolução nº 4.963/2021 do CMN, que rege os investimentos em fundos de pensão de Estados e prefeituras, diz que as aplicações em letras financeiras só podem ser feitas com a condição de que a instituição financeira emissora não tenha o controle societário, direto ou indireto, por Estado ou pelo Distrito Federal. O Governo do Distrito Federal (GDF) é o controlador do BRB, com 65,63% das ações totais. Nos documentos referentes à aplicação, o Instituto de Previdência do Amapá identifica as letras compradas do BRB como subordinadas. Essa classe de títulos pode ser emitida pelos bancos para ajudá-los a atender os critérios mínimos de solidez exigidos pelo BC, na estrutura de capital.

Trata-se de uma categoria de investimento com maior risco para quem compra o título porque, além de não contar com a proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), coloca o credor no fim da fila em caso de liquidação, podendo até torná-lo acionista. A contrapartida para um investidor aceitar essas condições costuma ser uma remuneração maior do papel. No demonstrativo de investimentos da entidade do Amapá, a letra financeira de R$ 100 milhões está identificada como Genial Investimentos. Só é possível saber que o emissor é o BRB por meio de documentos secundários aos quais o Estadão/Broadcast teve acesso. Neles, o banco regional aparece como emissor; a Genial, como a corretora do negócio; e o Banco Master, como custodiante.

A operação tem data de 21 de fevereiro. Outra compra de letra financeira registrada no mesmo dia, no valor de R$ 150 milhões, também leva o nome da Genial, mas nesse caso o emissor é identificado como a própria Genial Corretora. Porém, procurada, a Genial afirmou ao Estadão/Broadcast que não emite letras financeiras.

O BRB vem emitindo letras financeiras subordinadas ao mercado desde 2022, para melhorar seu índice de Basileia, referência de solidez das instituições financeiras. Em paralelo, a instituição também chamou aumentos de capital para reforçar a parcela principal do Basileia, o mais relevante na análise dos índices mínimos dos bancos. No ano passado, o BRB fez dois aumentos de capital, totalizando mais de R$ 1 bilhão, dos quais R$ 750 milhões ainda em fase de aprovação pelo BC.

O negócio com o Master deve exigir ainda maior robustez do BRB nas contas de capital, já que a operação como um todo — se aprovada pelo BC— ficará maior e o banco tem uma estratégia agressiva de diversificação geográfica e de produtos. Justamente por conta dessa expansão nos últimos anos, houve consumo de capital principal, fazendo com que o BRB tenha flertado com os níveis mínimos de capital principal exigidos pelo BC. Por outro lado, há análises que colocam o negócio com o Master com um potencial positivo para os níveis de capital do BRB, uma vez que, a depender do desenho, o Master poderia “emprestar” ao BRB seus índices, um pouco mais folgados, independentemente da qualidade dos ativos.

Ameaça – A agência de classificação de risco Moody’scolocou sob revisão a nota de crédito do BRB, para um possível rebaixamento, após o anúncio de aquisição de 58% do capital do Banco Master, em 28 de março. A nota de longo prazo do banco é B1, tanto em moeda local quanto em moeda internacional. Esse nível está fora do chamado “grau de investimento”, que indica menor risco de calotes.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o analista sênior da Moody’s, Daniel Girola, afirma que o nível de capital principal do banco do Distrito Federal tem sido um dos maiores pontos de atenção nas análises da agência de classificação de risco. Ainda que a condição precedente para a aquisição de fatia do Master seja de que o capital combinado supere o do BRB hoje, para Girola, os desafios nesse tema não estarão eliminados imediatamente.

A combinação dá conforto, mas ainda esperamos pressão no capital porque acreditamos que a estratégia de crescimento seja mantida, fazendo com que o capital continue sendo consumido”, disse. O BRB fechou 2024 com lucro de R$ 282 milhões, alta de 40,9% em relação a 2023, e uma carteira de crédito de R$ 41,3 bilhões. Os ativos somaram um total de R$ 61 bilhões. Porém, encerrou o quarto trimestre com o índice de Basileia em 12,94%, abaixo do patamar de 14,68% do mesmo trimestre de 2023. O mínimo exigido pelo BC é de 10,5%. Já o capital principal tem ficado no limite dos 7% regulatórios desde dezembro de 2022, de acordo com a Moody’s. No quarto trimestre, segundo a Moody’s, o capital principal estava em 7,12%.

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Jornalista responsável: Evandro Corrêa- DRT 1976