Para assegurar mais condições de operação e fiscalização à Agência Nacional de Mineração (ANM), duas entidades do setor entraram com representação em vários órgãos federais para que o valor obtidos com os royalties minerais seja, de fato, repassados à agência. A União tem contingenciado quase 90% do que é de direito da ANM.
Pela legislação, 7% do recolhido como Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), cabe à agência, criada em 2017, para realização de suas atribuições. No ano passado, a CFEM total sobre a mineração no país gerou R$ 7,02 bilhões.
Dessa forma, a parcela da ANM foi de R$ 491,3 milhões. No entanto, foram repassados só R$ 53,49 milhões – 10,88% – para execução de seus projetos e atividades. O contingenciamento é efetuado pelo Poder Executivo da União em seu orçamento, aponta a representação do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos (IBGM) e do Instituto Somos do Minério (SDM).
As duas entidades observam no documento que “o valor é expressivamente inferior a que tem direito por Lei, transformando a ANM em um ente incapaz de exercer a devida função reguladora (…) face o ilegal contingenciamento de R$ 437.772.413,76, que deixou de ser repassado aos cofres da Agência”.
Écio Morais, diretor-executivo do IBGM, afirma que se observa um fato concreto com o contingenciamento: o desmantelamento da agência. Que já sofria com aposentadorias e não reposição de técnicos. Com isso, ressalta, a ANM não consegue fiscalizar todo o setor no país e fica afetada na emissão de concessões de lavra.
“Com essa apropriação indébita de recursos, toda a estrutura da agência começa a precarizar”, declara Morais. Ele acrescenta: “Sem capacidade operacional, a ANM fica sem condições para trabalhar sobre as questões de garimpo ilegal e ambientais, além de problemas como o acompanhamento das situações de barragens”.
O que ocorre na cadeia de extração do ouro – garimpo ilegal, com degradação do meio ambiente – motivou o IBGM a tomar frente nesse caso. “Sem fortalecer a ANM não será possível mitigar esse problema do garimpo”, diz.
A representação, encaminhada a vários órgãos da estrutura da União – ministérios de Minas e Energia, Fazenda, Justiça, Povos Indígenas, Meio Ambiente e Procuradoria Geral da República – é um primeiro passo. De alerta para o problema, diz Morais.
“Ela aventa com a possibilidade de um crime de responsabilidade, pois o contingenciamento de recursos da ANM já vem ocorrendo há bom tempo”.
Para Roberto Cavalcanti Batista, do SDM, o contingenciamento que se verifica dos recursos de royalties minerais oriundos da CFEM, que cabem à ANM, é gravíssimo. Ele observa que a lei que criou a agência estabelece que seus recursos orçamentários vêm da CFEM, de cobrança por área explorada das mineradoras e por multas. Todavia, ao mesmo tempo estipulou 39 atribuições à ANM. Entre essas atribuições a exploração ilegal. Porém, afirma, a agência não tem recursos suficientes, quadros para fiscalizar e nem aparato tecnológico para suportar toda essa carga.
Batista avalia que todo esse caos que se observa na Amazônia, com invasão de terras indígenas, narcotráfico, exploração ilegal, entre outras questões, é de responsabilidade da União, que não dota a agência com os devidos recursos.
O dirigente do SDM afirma que a CFEM é transversal a todo o setor de mineração, como alimentador de diversas atividades nas regiões exploradas, repassando recursos aos Estados e municípios onde a mineração ocorre, apesar de vários desvios de autoridades para outras finalidades.
A distribuição da receita oriunda do recolhimento da CFEM é dividida da seguinte forma: os municípios onde ocorre a produção mineral ficam com 60% do valor: Distrito Federal e municípios quando afetados pela atividade e a produção não ocorrer em seus territórios, 15%; os Estados onde ocorre a produção, 15%%; a ANM, 7%; e 3% vão para outros órgãos, como Cetem, FNDCT e Ibama. Aliás, o Ibama também teve o valor de sua cota-parte, R$ 16,8 milhões, não repassados, segundo a representação do IBGM e do SDM.
Fonte: Valor