Em ao menos 46 municípios do Brasil, sendo 17 deles em São Paulo, o candidato a prefeito que teve votos suficientes para ser eleito já no primeiro turno ainda depende de decisão judicial para saber se poderá ou não assumir o cargo. No Pará, em apenas um município, Peixe Boi, o prefeito eleito poderá não assumir. Isso porque, logo após o pleito, Neto Cavalcante, do MDB, teve o registro cassado pela justiça eleitoral por abuso de poder político. Caso, ao final, os candidatos tenham decisão favorável, assumem. Do contrário, a legislação prevê a realização de novas eleições. E se, até o fim do ano, os processos não tiverem um desfecho, quem assumirá interinamente será o presidente da Câmara Municipal.
Isso porque os votos são considerados “anulados sub judice”, situação que ocorre quando um membro da chapa teve o registro de candidatura negado pela Justiça Eleitoral, mas apresentou recurso ou ainda tinha prazo para recorrer na data da eleição. Como o cenário ainda poderia ser revertido, a legislação garante a esses candidatos que já têm uma decisão desfavorável o direito de seguir em campanha e que seus nomes constem nas urnas. O registro é indeferido quando se entende que aquele que pretende concorrer não preenche os requisitos para tanto, o que pode ocorrer, por exemplo, por um candidato ter condenação que o enquadre na Lei da Ficha Limpa ou tiver as contas enquanto gestor público rejeitadas por ato de improbidade administrativa.
Essa é a situação de Paulo Wiazowski (PP), que obteve 42% dos votos válidos a prefeito de Mongaguá, no litoral de São Paulo. O candidato, que já havia chefiado o Executivo municipal, teve o registro indeferido em razão de contas rejeitas pela Câmara local. Entre as cidades que esperam por decisão judicial para definição em São Paulo, é Mongaguá a mais populosa, com 65 mil habitantes. No país, o maior município na situação é Vitória da Conquista, na Bahia, de 394 mil moradores.
Ficam também no estado paulista dois municípios em que candidatos que constam como “anulados sub judice” se classificaram para o segundo turno, em Mauá e Jundiaí. Conforme prevê a Constituição, apenas cidades com mais de 200 mil eleitoras e eleitores, e nas quais nenhum candidato obteve mais de 50% dos votos, têm segundo turno. Em Jundiaí, quem está com o registro sob apreciação judicial é o segundo colocado na disputa, Gustavo Martinelli (União Brasil), ex-presidente da Câmara Municipal, por ter tido as contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado. Se até o segundo turno houver uma decisão definitiva para indeferir o registro do candidato, os votos que ele recebeu no primeiro turno são anulados. A partir daí, a depender do percentual daquele que ficar em primeiro colocado, ele pode ser declarado eleito no primeiro turno, caso tenha mais de 50% dos votos, ou aquele que estava em terceiro colocado volta para a disputa e concorre ao segundo turno.
Além dos casos em que os votos dos candidatos foram anulados por registros estarem indeferidos com recurso, também existem situações nas quais os registros de prefeitos e vices eleitos foram deferidos, mas ainda pode haver uma mudança a partir da análise de recursos. Até esta sexta-feira (11), em 229 municípios, o prefeito —ou o vice da chapa que foi eleita— estava nesta situação. Em outros cinco municípios, isso se aplica ao candidato que foi para o segundo turno. A principal diferença das candidaturas “deferidas com recurso” para as “indeferidas com recurso” é que, nas primeiras, os votos dados a elas são considerados válidos e o candidato eleito pode assumir o cargo. No entanto, se houver uma decisão final rejeitando o registro da pessoa eleita, os votos são então anulados e, se for o caso, uma nova eleição pode ser convocada. Para vereadores, caso alguma situação seja revertida, há uma retotalização dos votos e redistribuição das vagas.
Especialistas afirmam que o prazo de pouco mais de cinco semanas entre a data-limite para registro de candidatura —em 15 de agosto— e a eleição representa um desafio para que todos os registros sejam julgados de forma definitiva a tempo. Mais de 463 mil pessoas se inscreveram para concorrer no pleito municipal, em 26 estados. Neste ano, a cinco dias do pleito, cerca de 6.000 os candidatos ainda tinham situação pendente (constando como indeferido ou deferido com recurso).
A Missão de Observação Eleitoral da OEA (Organização dos Estados Americanos) voltou a ressaltar a questão em relatório preliminar elaborado sobre o primeiro turno da eleição deste ano. O documento relembra que, nas eleições de 2018, 2020 e 2022, já teria manifestado “preocupação com a incerteza gerada para o processo eleitoral no que tange à demora em obter uma decisão definitiva sobre esses registros”. Entre os caminhos alternativos para lidar com o problema, estaria a mudança dos prazos para registro de candidatura, de modo que eles ocorressem com uma distância maior da data da eleição.