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São Felix do Xingu. A Prefeitura. O João Cleber. A Ação Popular. O Leilão. O Juiz e a Suspensão

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O juiz Jessinei Gonçalves de Souza, Titular da Vara Cível e Empresarial da Comarca de São Félix do Xingu, deferiu liminar determinado a suspensão de um leilão de alienação de veículos da prefeitura de São Félix, ( leia-se João Cleber), que seria realizado na quinta-feira,05. O descumprimento da decisão, diz a liminar, ensejará multa diária de R$ 10 mil reais, limitada à R$ 100 mil reais, além de possível caracterização de ato de improbidade administrativa.

Na decisão, o juiz acatou a tese da Ação Popular protocolada por Rafael Pianco de Souza, sustentando que a licitação padece de desvio de finalidade, uma vez que não há interesse público na alienação dos veículos, mas objetiva tão somente prejudicar o início da gestão do próximo prefeito eleito.

“Nesse passo, constatado vício no edital, tenho que o requisito da probabilidade do direito está preenchido. Considerando que é fato público e notório que o atual prefeito perdeu as últimas eleições municipais e que uma nova gestão se avizinha, entendo que eventual alienação de veículos, há poucos dias do fim do ano, pode acarretar grandes prejuízos no que tange à continuidade da prestação de serviços públicos à população local.” Pontou o juiz. Leia abaixo a liminar na íntegra:

Trata-se de ação popular com pedido de tutela de urgência ajuizada por RAFAEL PIANCO DE SOUZA em face do MUNICÍPIO DE SÃO FÉLIX DO XINGU. Narra a inicial que o Município de São Félix do Xingu/PA publicou o edital no 0001/24, que dispõe sobre a realização de leilão para a venda de bens móveis supostamente inservíveis (automóveis), previsto para acontecer em 05/12/2024. Alega que a licitação padece de desvio de finalidade, uma vez que não há interesse público na alienação dos veículos, mas objetiva tão somente prejudicar o início da gestão do próximo prefeito eleito. Por fim, também alude a vícios formais no edital de licitação. Em sede de tutela de urgência, pleiteia a suspensão do leilão.

Instado, o Ministério Público pugnou pelo deferimento da tutela provisória (id. 132689531).

É o sucinto relatório.

Fundamento e decido.

A título introdutório, define-se ação popular como um instrumento da democracia participativa (CF, art. 1o, parágrafo único), uma ferramenta por meio da qual o cidadão pode participar do controle dos atos da Administração, fiscalizando sua idoneidade. Trata-se de mecanismo de tutela de interesses transindividuais, pois permite impugnar atos lesivos a bens difusos: o patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe ou para a qual contribua financeiramente; a moralidade administrativa; e o meio ambiente. A ação popular tem lastro Constitucional (art. 5o, LXXIII): LXXIII – qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovado má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. No plano infraconstitucional, é disciplinada pela Lei 4.717/1965, conhecida como Lei da Ação Popular (LAP).

Nesse passo, pontuo que o autor demonstrou a condição de cidadão por meio de seu título de eleitor (id. 132333162), em atendimento ao disposto no art. 1o, § 3o, da Lei 4.717/1965. Após breves comentários sobre o instrumento da ação popular, passo ao exame da tutela de urgência. Segundo a lei processual, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. A tutela provisória de urgência pode ser de natureza cautelar ou satisfativa, a qual pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. O regime geral das tutelas de urgência está preconizado no artigo 300 do Código de Processo Civil que unificou os pressupostos fundamentais para a sua concessão: “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. Este documento foi gerado pelo usuário 526.***.***-49 em SOUZA – 30/11/2024 10:24:28 Num. 132719519 – Pág. 2

No caso em tela, faz-se necessário comentar, ainda que de forma sintética, sobre os requisitos legais para alienação de bens públicos móveis. O art. 76, II, da Lei 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos) reza que a alienação de bens da administração, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e dependerá de licitação na modalidade leilão, salvo as hipóteses legais de dispensa. Observo da narração da exordial e das petições subsequentes, bem como dos documentos carreados à inicial, que o edital de licitação no 0001/24 (id. 132333138), embora invoque em seu corpo o Anexo I, que trataria da avaliação dos bens, não o contemplou quando de sua publicação, em afronta expressa ao disposto ao art. 31, § 2o, II, da lei 14.133/2021. Importa destacar que o art. 2o, “b” da lei 4.717/1965 afirma que o vício de forma, entendido como omissão ou observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato, é causa de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público.

Nesse passo, constatado vício no edital, tenho que o requisito da probabilidade do direito está preenchido. Considerando que é fato público e notório que o atual prefeito perdeu as últimas eleições municipais e que uma nova gestão se avizinha, entendo que eventual alienação de veículos, há poucos dias do fim do ano, pode acarretar grandes prejuízos no que tange à continuidade da prestação de serviços públicos à população local. Não se trata, por evidente, de incursão ao mérito do ato administrativo, mas de questionamento ao aparente desvio de finalidade, é dizer, prática de ato visando fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência (art. 2o, “e”, da Lei 4.717/1965), elemento passível de controle por parte do Poder Judiciário.

Presente, portanto, o perigo de dano. Outrossim, destaco que a própria lei de regência prevê expressamente a possibilidade de suspensão liminar do ato lesivo impugnado, com vistas à proteção do patrimônio público (art. 5o, § 4o, da Lei 4.717/1965. Em resumo, a alienação de bens móveis inservíveis, pela modalidade leilão, pressupõe avaliação prévia e formulação de justificativa que evidencie o interesse público. No caso concreto, ausente a avaliação prévia dos bens, bem como de informações fidedignas sobre o estado de conservação dos veículos, não sendo evidente o interesse público, tem-se, em princípio, que a alienação pretendida não atende aos preceitos da Lei 14.133/2021.

Ante o exposto,

DEFIRO O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA para o fim de determinar a SUSPENSÃO DO LEILÃO DE ALIENAÇÃO DE VEÍCULOS DA PREFEITURA DE SÃO FÉLIX DO XINGU/PA (Edital no 0001/24), que seria realizado na data de 05/12/2024. O descumprimento desta decisão ensejará multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), limitada à R$ 100.000,00 (cem mil reais), além de possível caracterização de ato de improbidade administrativa. CITE-SE a parte ré. Cópia desta decisão deverá ser enviada à empresa responsável pela condução do certame suspenso.

Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se, inclusive em regime de plantão, caso necessário.

São Félix do Xingu/PA, datado e assinado eletronicamente.

JESSINEI GONCALVES DE SOUZA

Juiz de Direito Titular da Vara Cível e Empresarial da Comarca de São Félix do Xingu/PA.

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